Em 1980, os moradores do Residencial dos Lagos, à beira da Represa Billings, na zona sul de São Paulo, precisavam mentir o endereço do lugar onde moravam para ter alguma chance de serem contratados nas entrevistas de emprego. O mesmo ocorria em Paraisópolis e em Heliópolis, as duas maiores favelas de São Paulo, também na zona sul, e no Jardim São Francisco, na zona leste, cujos barracos de madeira, iluminados por gatos que roubavam a luz dos postes, cortados por ruas de terra sem rede de esgoto, eram cenários de um ambiente violento, com taxas elevadas de assassinatos.
As melhorias decorrentes das lutas sociais das décadas passadas, que se transformaram em investimentos em infraestrutura, ajudaram não somente a amenizar o preconceito contra os moradores das favelas como também serviram para valorizar fortemente o preço dos terrenos nas comunidades que receberam investimentos públicos. "Barracos" viraram "imóveis" e os preços dispararam até 900%.
No Residencial dos Lagos, que começou o processo de urbanização em 2008, uma casa de três quartos, sala e banheiro, que anteriormente era alugada por R$ 200, hoje custa R$ 700. É difícil encontrar aluguel nas favelas por menos de R$ 400 - valor do bolsa-aluguel pago pela Prefeitura para aqueles que são removidos de barracos em área de risco.
Mas o preço para a compra dos imóveis também disparou, chegando a se multiplicar por dez. Casas de quatro a cinco cômodos, que antes da urbanização eram vendidas por R$ 15 mil a R$ 20 mil no Residencial dos Lagos, hoje não são vendidas por menos de R$ 100 mil, podendo chegar a R$ 150 mil. "E mesmo assim é difícil encontrar quem queira vender porque ninguém vai querer sair daqui", diz a líder comunitária Vera Lucia Basália, integrante do comitê gestor do processo de urbanização local.
Sem medo. Em Heliópolis, a valorização segue a tendência de alta. Um imóvel de dois quartos, sala e cozinha, que em 2002 era alugado por R$ 280, atualmente sai por R$ 800. O preço de venda passou de R$ 20 mil para R$ 100 mil. "As pessoas tinham medo de entrar aqui e o estigma de favelado era muito forte e prejudicial. Hoje Paraisópolis está inserida na cidade", diz Paulo Henrique da Silva, que mora no bairro há 28 anos e estuda Contabilidade na FMU do Itaim-Bibi. Quando ele mudou para lá, Paraisópolis tinha 3 escolas. Hoje, são 15. "Ontem, na universidade, uma colega me perguntou se eu morava na favela. Se fosse no passado, eu ficaria constrangido. Hoje sinto orgulho e sei que qualquer estranheza é desconhecimento por parte dela."