Raio corta o céu de Campinas, no interior de São Paulo, durante tempestade (Foto: Jácomo Jackdimmit Piccolini/Elat-INPE )
Um levantamento feito por pesquisadores brasileiros do Grupo de Eletricidade Atmosférica (Elat) mostrando que 80% das mortes causadas por raios no país poderiam ter sido evitadas foi o principal mote para a produção do filme “Fragmentos de paixão”. O longa estreia nesta sexta-feira (11) nas salas da Rede Cinemark de São Paulo, Rio de Janeiro, Manaus, Porto Alegre e São José dos Campos, no interior paulista.
A falta de informação sobre como se proteger das descargas elétricas chamou a atenção do pesquisador Osmar Pinto Junior, coordenador do Elat, ligado ao Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o Inpe.
Segundo ele, o percentual é alto e preocupante. "Se é por falta de informação [que as mortes acontecem], nós temos que agir", disse o cientista.
O estudo em questão mostrava que na década passada, dos 1.332 óbitos causados por raios no país, 80% ocorreram com pessoas que estavam em um campo aberto durante uma tempestade elétrica, se esconderam debaixo de árvores ou faziam atividades como dirigir tratores ou andar com enxadas em lugares desprotegidos.
Dirigido por Iara Cardoso, jornalista e filha do pesquisador, o documentário traça um paralelo entre as descargas elétricas e a história do Brasil, país que está em primeiro lugar na lista de ‘alvos’ de raios em todo o mundo por registrar anualmente 57,8 milhões de raios, segundo o Elat. São 14,8 milhões a mais que o segundo lugar no ranking, a República Democrática do Congo, que recebe 43 milhões de descargas ao ano.
Segundo Osmar, a explicação para o “título mundial” é simples: "somos o país com maior extensão tropical do planeta", região considerada a mais quente da Terra e, consequentemente, a que mais forma tempestades ao longo do ano.
Vidas afetadas
O filme mostra histórias verídicas, atuais e que ocorreram há muitos anos, de seis brasileiros impactados de alguma forma pelos raios.
O filme mostra histórias verídicas, atuais e que ocorreram há muitos anos, de seis brasileiros impactados de alguma forma pelos raios.
O título faz menção à paixão do cientista pelos raios e às seis vidas relatadas, no caso, os fragmentos.
Desde um pajé que vive em uma aldeia em Ubatuba (SP), e considera as luzes como um tipo de proteção -- e não ameaça (veja vídeo ao lado), ao relato de um funcionário aposentado do Inpe que, ao voltar do trabalho de bicicleta em um dia chuvoso, foi atingido por uma descarga e socorrido por uma mulher. Anos depois, ela se casou com ele.
“A ideia do filme é mostrar os perigos dos raios e levar informações para o público de forma atraente, com uma linguagem mais simples possível para que a pessoa possa entender o que acontece”, explica Osmar.
Foco na divulgação científica
Segundo Iara Cardoso, após sua exibição na telona, “Fragmentos” deve ser divulgado na televisão brasileira e do exterior. Segundo ela, já há uma versão do filme traduzida para o inglês. “Já inscrevemos o filme em alguns festivais e há um interesse pelo assunto lá fora, já que nunca houve um documentário sobre raios feito no Brasil. Havia interesse, mas não tempo de trabalhar em um material, já que demoraria anos para capturar as imagens dos raios”, explica.
Foco na divulgação científica
Segundo Iara Cardoso, após sua exibição na telona, “Fragmentos” deve ser divulgado na televisão brasileira e do exterior. Segundo ela, já há uma versão do filme traduzida para o inglês. “Já inscrevemos o filme em alguns festivais e há um interesse pelo assunto lá fora, já que nunca houve um documentário sobre raios feito no Brasil. Havia interesse, mas não tempo de trabalhar em um material, já que demoraria anos para capturar as imagens dos raios”, explica.
Ela comenta ainda que o fato de exibir o filme em salas comerciais de cinema, abrindo portas para um novo tipo de divulgação científica no país, é um impulso para a pesquisa brasileira.
“Estamos abrindo caminho. As pessoas falam que ninguém quer saber de história e ciência, mas eu não acredito nisso. A ciência parece distante, mas não é. [O filme] deve abrir portas para resgatar a história do país e, no caso da ciência, para que as pessoas conheçam mais a respeito”, explica.
“Estamos abrindo caminho. As pessoas falam que ninguém quer saber de história e ciência, mas eu não acredito nisso. A ciência parece distante, mas não é. [O filme] deve abrir portas para resgatar a história do país e, no caso da ciência, para que as pessoas conheçam mais a respeito”, explica.
Perigo que vem do céu
Levantamento feito pelo Elat, a partir de dados da Defesa Civil, do Ministério da Saúde e reportagens veículadas em jornais aponta que 2.640 pessoas de todo o país morreram atingidas por descargas entre 1991 e 2010.
Levantamento feito pelo Elat, a partir de dados da Defesa Civil, do Ministério da Saúde e reportagens veículadas em jornais aponta que 2.640 pessoas de todo o país morreram atingidas por descargas entre 1991 e 2010.
No mesmo período, segundo o Atlas Brasileiro de Desastres Naturais, divulgado em 2012 pelo Centro universitário de estudos e pesquisas sobre desastres (Ceped), ligado à Universidade Federal de Santa Catarina, morreram 2.475 brasileiros vítimas de enchentes de deslizamentos de terra.
Os números de mortes por raios podem aumentar no futuro caso se eleve a incidência de raios no país, possibilidade que pode acontecer devido à urbanização e aos efeitos da mudança climática, provocada pelo aumento da temperatura global.
De acordo com Osmar, cidades médias (500 mil habitantes) e grandes metrópoles poderão se tornar alvos frequentes de raios devido às ilhas de calor, fenômeno responsável pela sensação de abafamento e resultante do processo de adensamento urbano e impermeabilização do solo.
Materiais como asfalto, concreto armado, cimento e o excesso de prédios dificultam a circulação do ar, o que faz com que o calor se concentre em determinados pontos.
Além disso, existe a hipótese de que cada grau a mais de aquecimento da temperatura média global resulte em alta de 10% a 20% na incidência de raios. Quanto maior o calor, maior é a formação de chuvas na região dos trópicos. “Ainda não se consegue perceber um aumento dos raios em função da temperatura. Isso vai se manifestar aos poucos, nas próximas décadas”, explica.
Ainda segundo o Elat, o período que vai de outubro até março é considerado temporada de raios no Brasil, devido ao aumento de tempestades. De acordo com o grupo de pesquisas, Norte, Sul e Centro-Oeste deverão receber a maior quantidade de descargas durante a primavera, enquanto o Nordeste e o Sudeste serão mais impactados no verão.