O volume de mais de 6 mil páginas mostra, segundo Jorge Fraxe, a burocracia para uma obra A falta de engenheiros, a complexidade do processo licitatório e a ausência de planejamento estratégico estão entre os principais motivos da deficiência de projetos e obras no país, segundo os participantes de audiência pública sobre o tema realizada nesta quarta-feira (21) pela Comissão de Serviços de Infraestrutura (CI).
A audiência contou com a participação do diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), general Jorge Fraxe, que, logo no início, mostrou um projeto de obra de engenharia com 64 volumes, somando mais de 6,5 mil páginas. O projeto é referente à restauração da ponte internacional Barão de Mauá, que liga o Brasil ao Uruguai.
— As pessoas falam, comentam, reclamam que o Dnit demora com o projeto. Projeto de engenharia rodoviária, o projeto de uma ponte, de um viaduto, é diferente do projeto de uma casa. Isso é para demonstrar o nível de complexidade de elaborar um projeto de engenharia — disse o general.
Fraxe explicou que um projeto de engenharia é multidisciplinar, chegando a envolver 25 matérias. Ele esclareceu que o órgão terceiriza a elaboração dos projetos por meio de licitação e que, portanto, a qualidade depende do mercado. O general afirmou que as empresas que não cumprem cronograma ou erram no projeto estão sendo punidas.
— Cada projeto de engenharia, quando ele é recepcionado pelos analistas do Dnit, ele é entregue com, em média, 200 inconformidades — lamentou o presidente do órgão.
Para o diretor-executivo do Dnit, Tarcísio Gomes de Freitas, existe uma razão histórica para a falta de engenheiros no país, que seria a falta de investimento em infraestrutura a partir da década de 1980, com a crise do petróleo e a fuga de capital estrangeiro.
O especialista citou cinco causas para a baixa qualidade dos projetos e das obras. Segundo Freitas, a administração não sabe estabelecer metas e não cobra prazos das empresas; as equipes de licitação são despreparadas; a contratação de consultoria por licitação resulta em consultorias de baixo nível; as consultorias são mal remuneradas; e as ferramentas de tecnologias de informação sofisticadas não são utilizadas. Ele apostou no Regime Diferenciado de Contratações (RDC), o sistema de licitação simplificada criado para as obras da Copa do Mundo, como boa alternativa para resolver muitos dos problemas.
— Eu tenho acompanhado os debates do RDC aqui no Congresso, por causa da Medida Provisória 630, porque o RDC traz boas práticas que já estavam positivadas no mundo afora, é uma maneira moderna de fazer contratação e que resolve boa parte dos problemas que foram aqui falados — disse.
Mas, para o senador Wilder Morais (DEM-GO), que presidiu a reunião, o RDC pode funcionar para o Dnit, mas não seria o ideal para tudo.
— Em outros órgãos, isso é um pouco temerário. Um exemplo disso é a Copa do Mundo. Nós não temos nenhuma arena praticamente igual ao preço da outra. Então a discrepância é gigante — afirmou.
Para o ex-presidente do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), Wilson Lang, é preciso mudar a eficiência da gestão pública e o Legislativo precisa trabalhar mais e ter autonomia para mudar a legislação.
- Não existe na história da humanidade, país que se desenvolveu sem engenharia e sem infraestrutura – ressaltou.
Valorização do engenheiro
Questionado pelo senador Wilder Morais se havia engenheiros suficientes no Dnit e se a carreira era atrativa, o general Fraxe respondeu que não. Ele disse que os engenheiros do Dnit são muito capacitados, mas são poucos para a demanda. Além disso, o salário também seria insuficiente. O general reclamou ainda da falta de profissionais específicos como topógrafos e laboratoristas de solo.
— Eu fui autorizado a fazer um concurso público e briguei por 1.200 vagas, para diminuir a dificuldade do Dnit. 117 mil candidatos se inscreveram e fizeram a prova. Apenas 800 foram aprovados. Menos de 1% foi aprovado no concurso, entre engenheiros, administradores, economistas. E teve uma grande deficiência, que foi topógrafo e laboratorista de solo — relatou.
Para o representante da Federação Nacional dos Engenheiros, Florentino de Souza Filho, faltam engenheiros porque não há valorização do profissional nos âmbitos público e privado. Ele reclamou do descumprimento, por parte das empresas privadas, da Lei 4.950-A/66, que estabelece o piso de 9 salários mínimos para os engenheiros e da discrepância de salário entre profissionais diferentes no setor público.
— É inadmissível que o poder público remunere com R$ 20 mil o advogado e com R$ 2 mil o engenheiro do seu quadro. Isso está espalhado em todos os âmbitos do poder público — criticou.