| Em nome do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado de São Paulo – Crea-SP e, por extensão, em nome do quase meio milhão de profissionais registrados em nossa Autarquia ao longo dos oitenta anos de sua honrosa história, cidadãos e cidadãs que exercem suas atividades profissionais com a maior responsabilidade dentro de contextos políticos e sociais adversos durante a maior parte de suas vidas, nunca por culpa de suas formações acadêmicas e nem pela falta de vontade de apreender novos métodos e tecnologias praticados pelo mercado, pais e mães de família que certamente se sentiram ofendidos com as declarações equivocadas do ministro-chefe da Secretaria de Aviação Civil da Presidência da República, Wellington Moreira Franco, emitidas no final da semana passada a respeito da qualidade do engenheiro brasileiro, venho aqui manifestar minha total indignação de engenheiro civil formado há quarenta anos, e servindo à luta classista por mais de três décadas, com as palavras deste mandatário governamental apresentado pelos sites de busca como "um político brasileiro", definição graças a Deus bastante diferente do significado de "engenheiro brasileiro".
Moreira Franco mostra-se despreparado e desinformado ao declarar que a culpa pelo atraso de obras para a Copa do Mundo se deve aos engenheiros brasileiros, que, segundo o político, "são ruins e elaboram projetos mal feitos". Culpa de engenheiros ou de gestores incompetentes? Disse ainda o ministro, durante o evento "Encontro Nacional de Editores da Coluna Esplanada", promovido pelo jornalista Leandro Mazzini no dia 31 próximo passado, que "na hora da execução, todo o planejamento e cálculos tem de ser refeitos e a obra atrasa, além de ficar mais cara". "Os atrasos não acontecem por falta de dinheiro ou de vontade, é por responsabilidade", continuou ele. "Os projetos que pegamos para executar são muito ruins, e temos refazer todos eles", afirmou Franco a dezenas de jornalistas editores de jornais regionais. "Temos uma geração inteira de engenheiros nos anos 1970 e 1980 que saíram da faculdade direto para o mercado financeiro, então há uma carência de profissionais experientes e qualificados nessa área. Os jovens não saem bem formados da faculdade e os projetos são muito ruins", disse. "As empresas têm uma dificuldade muito grande em suprir isso e fazem verdadeiros milagres", continuou, sobre as obras tocadas pela Infraero, sob a responsabilidade do governo. Mas como manifestações de indignação não são suficientes para iluminar debates provocados por leigos protegidos no conforto do poder, sentimo-nos na obrigação moral de vir a público para apoiar as palavras de verdadeiros brasileiros que lutam na defesa das nossas categorias profissionais e ainda externar nossa própria opinião a respeito das desastrosas declarações.
Concordamos inteiramente, e não poderia ser diferente em nome da Engenharia Brasileira, com as posições da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE) e da Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (Fisenge) relativas às declarações de Moreira Franco. A primeira representa 18 sindicatos estaduais da categoria e afirma corretamente que "a engenharia civil brasileira, apesar das duas décadas de estagnação que frearam investimentos e oportunidades de trabalho, tem sido reconhecida no País e no exterior e é considerada do mais alto nível". Ou seja, a Engenharia Brasileira não precisa da retratação do Sr. Moreira Franco quanto ao que disse publicamente sobre a qualidade dos nossos profissionais, esta reconhecida em qualquer parte do mundo. Mas é preciso, sim, deixar claro que projetos bem concebidos são incompatíveis com o tipo de contratação pelo menor preço, como exige o setor público. Estão certos a FNE e seus abnegados dirigentes quando dizem que a contratação que leva em conta a qualidade dos projetos é melhor para os cofres públicos e para a população. O problema é de gestão pública.
Quanto à resposta da Fisenge, não poderia ter sido mais verdadeira e realista, revestida de uma coragem e de um senso de patriotismo tão necessários à Nação nos dias de hoje: a aceitação de projetos básicos para efeito de licitação é praticamente uma imposição da Lei nº 8.666, reforçada pelo "cipoal" da burocracia que envolve todo esse processo, "além e principalmente da incúria aliada à incompetência de seus dirigentes do Ministério" – citando diretamente a Secretaria "administrada" por Moreira Franco.
Antes, porém, de tecermos as nossas considerações finais, vemo-nos diante do duro dever de discordar da posição do nosso Conselho Federal de Engenharia e Agronomia – Confea. Na verdade, entendemos que as declarações em nome do Confea, relativas ao caso, não refletem a opinião mais representativa dos profissionais que o fazem, ou seja, a totalidade de seus Conselheiros e altos mandatários, além dos profissionais colaboradores. Não é possível aceitar que o Brasil teve seu desenvolvimento industrial "estagnado" por trinta anos e muito menos que a formação em Engenharia não fora atraente durante esse período. Os engenheiros não deixaram de construir o País nem por um minuto ao longo de toda a sua história e, da mesma forma, as melhores escolas da área não deixaram de produzir os melhores profissionais. O que foram forçados a fazer, todos, os experientes e os novatos, – e o fizeram com denodo e dignidade – foi submeter-se às vicissitudes de gestões públicas incompetentes e viciadas, para emergirem hoje orgulhosos de sua façanha.
Como pode o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia, que, como diz em nota oficial o Sindicato dos Engenheiros de Minas Gerais, "deveria ser o primeiro a se contrapor firmemente às declarações descabidas do ministro", concordar com a falácia de que "temos uma geração inteira de engenheiros nos anos 1970 e 1980 que saíram da faculdade direto para o mercado financeiro"? Que generalização é essa, que deturpa dados estatísticos sem qualquer base científica? Como podemos aceitar que "há carência de profissionais experientes e qualificados nessa área" e que "os jovens não saem bem formados da faculdade"? Basta fazer uma leitura diária dos noticiários da área tecnológica para compreender nosso ponto de vista – e aqui vão apenas quatro exemplos dentre as dezenas que poderíamos citar: "FEI vence 10ª edição do Fórmula SAE Brasil-Petrobras"; "Eureka Mauá 2013 reúne 137 trabalhos com foco em tecnologia inovadora"; "Laboratório da Poli/USP conquista 1º lugar no Prêmio Von Martius de Sustentabilidade"; "Aluno e professor do ITA recebem prêmio da Secretaria de Assuntos Estratégicos". Os jovens não saem bem formados da faculdade, Sr. Ministro?
Por fim, entendemos que, na tentativa de retratação de Moreira Franco, a emenda saiu pior que o soneto. Na nota oficial que divulgou visando às pazes com os engenheiros, o político disse que "o país ficou quase três décadas sem investimentos em infraestrutura". Ledo engano. Ou só desinformação? Algum investimento foi feito na área. Disse também que "esta tragédia (...) desorganizou a engenharia nacional". Mais desinformação! Nenhuma tragédia nacional conseguiu até hoje desorganizar a Engenharia Brasileira. Disse, mais adiante, que "tal situação provocou um gap geracional, interrompendo o processo natural de qualificação profissional pela transferência de conhecimento via estágio e convivência com os mais experientes. Hoje, com o retorno dos investimentos em obras públicas, estamos em fase de recuperação do tempo perdido". Quer dizer o Sr. Ministro que é o setor público que se incumbe de recuperar o tempo perdido da Engenharia Brasileira, quando a iniciativa privada por décadas a fio tirou leite de pedra na geração de empregos? Por fim, deixo aqui uma última pergunta, não ao ministro, mas a todos os brasileiros de sã consciência que se dão ao trabalho de ler estas linhas: é possível acreditar no representante do governo que, num dia, diz que os engenheiros brasileiros são ruins e, no outro, que é "admirador e defensor da qualidade e criatividade do engenheiro brasileiro"?
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